sexta-feira, junho 29, 2007

Faísca

Boate. Mulheres e homens dançando, bebendo. Luxúria.
A bela jovem rebolava como nenhuma outra e chamava a atenção toda para si. O corpo desenhado serpenteava despertando fascínio em muitos; raiva em algumas. De um lado, mulheres invejosas, com seus olhares de desdém; do outro, homens desejosos, imaginando coisas. Ninguém ficava indiferente àquela volúpia.

O namorado estava ali, logo atrás da jovem companheira, a rir com os amigos, sem perceber seu redor. Sua linda mulher enfeitiçava a todos, solta, livre. De súbito, alguém lhe esbarra. Ao virar, o rapaz se depara com um homem forte, troncudo, olhando fixamente para sua namorada, claramente despindo-a em sua imaginação.
O rapaz - magro, não magricelo - nada intimidador, encarou o homem como alguém que teve a honra desrespeitada.

Entreolharam-se por infinitos três segundos antes do primeiro empurrão. O rapaz foi lançado para trás, e, com esforço, manteve o equilíbrio; o bastante para desferir um soco na face daquele homem um palmo maior que ele.

Tinha início a confusão. A namorada tinha sido empurrada no meio da atabalhoada multidão e, de longe, só via seu namorado com as mãos em riste, frente a frente a outro mais forte e maior. Sentiu medo.

Indiferente a briga que se generalizava, um não proposital ringue de gente era formado em volta daqueles dois.

O forte lançou o braço; o magro desviou. O magro chutou; o forte pareceu não sentir.
Não tinha para onde escapar. Uma muralha de pessoas empurrando umas as outras impedia.

Um soco acertou, e o magro foi como que rolando, pulando, rodando, procurando onde se segurar; caiu. Balançou a cabeça buscando acordar. Viu algo como um touro furioso vindo em sua direção. Deu uma cambalhota ágil e caiu com a mão por cima de uma garrafa, quando, por puro reflexo, a lançou no adversário. Em cheio na testa.

O sangue escorria; a fúria aumentava. Serpenteando como um vulto, uma mão segurando outra garrafa zuniu pelos ares e acertou o touro novamente. Era a namorada.
O casal se viu, cúmplice, sorriso no canto da boca. Desataram a correr para a saída, suas mãos se encontraram e se apertaram. Surgiram pelas ruas, rápidos como dois gatunos na noite.




quarta-feira, junho 27, 2007

Magricelo

Magricelo. Narigudo. Bom coração. Hormônios em ebulição. 17 anos.
Uma coleção inimaginável de revistas masculinas.

Um rapaz amargurado por não encontrar uma mulher perfeita como aquelas das revistas. Quando achava ter avistado uma com os atributos requeridos, sempre faltava algo. Percebia alguma imperfeição que cortava todo seu tesão. Era sempre assim.

Teve a chance de beijar – entre outras coisas - várias mulheres, mas não, nenhuma era como as maravilhas das revistas.

Em vez de aceitar sair com suas pretendentes, viajava por sua imaginação. Um mundo no qual tinha e possuía todas as perfeitas. Uma por uma, talvez duas, três, ou até várias ao mesmo tempo. Sem limite de tempo. Nada para desagradar.

Mas, na vida real, um virgem. Não contava para os amigos, claro. Porém, incrivelmente, não tinha vergonha ou tanta pressa assim. Queria uma daquelas deusas voluptuosas de curvas perfeitas.

Arrumou um emprego, trabalhou, juntou dinheiro.
Procurou na internet. Serviço de acompanhantes. Pelas fotos pareciam ser como “aquelas”.
Ligou e pediu a mais perfeita de todas: “como as das revistas”. Era a mais cara, obviamente. Não se importava.

Ah! Perfeição de mulher. Nada fora do lugar. Nenhuma cicatriz, nenhuma marca, nenhuma falha física. Seios médios apontando para o céu. Cintura fina como uma ampulheta. Quadril largo na medida certa, culminando em duas formas arredondadas e arrebitadas.

Ela despiu-se vagarosamente. Os olhinhos dele brilhavam, lacrimejando de emoção.
Parecia-lhe gigante. Ele era Davi.

Olhou nos olhos da mulher. Fixou o olhar. Não sentiu nada.

Foi imperfeito. Desastroso, na verdade. Derrapou em cada curva da moça. Cada movimento foi mecânico, sem sentimento, triste.

Decepcionado, passou a semana triste e cabisbaixo. Uma colega de trabalho, gordinha simpática e carismática, de sorriso franco e voz bondosa, sentindo a tristeza do magricelo rapaz, foi confortá-lo.

Saíram, tomaram uns chopes. Acabaram no motel. Nada mais importava para ele.

Lá, olhou nos olhos dela. Fixou o olhar. Sentiu tudo.

Foi perfeito. Deliciou-se com cada curva a mais da moça. Se afogou por completo no corpo daquela verdadeira mulher. Sedento, feliz, realizado.








quinta-feira, junho 14, 2007

Necessários

E amigos? Amigo é briga; é amor.

Amigo de verdade tem lealdade acima de tudo. Amigo sabe que é amigo. Amigo é base, é quartel-general. É chão.

É babaquice levada ao extremo. Você pode ser... você. E ser aceito, amado. Você pode ser ridículo, daquele jeito que todos te olharão estranho, incluindo até seus próprios amigos, mas eles não te abandonarão. Talvez te abandonem por alguns minutos devido à vergonha, mas voltarão logo depois.

Lembrar de suas histórias, lembrar dos seus amigos, é uma alegria tremenda. Aquele carnaval, aquele chopp, aquele rodizio de pizza, aquele dia na escola ou na faculdade, o dia naquela boate ou naquele churrasco, tantos lugares. E o show na praia! Lembra?

Quando estava na sarjeta. Quando estava no auge.

Das lágrimas no ombro à gargalhada ensurdecedora.

Eles estavão lá.

Amigo é aquele que você pode ficar anos sem ver. E quando encontrar vai ser como se tivesse passado um único dia. A mesma babaquice. O mesmo sorriso. As mesmas histórias. Já te magoou, odiou e amou. Talvez até isso tudo num espaço de poucos minutos.

Amigo é aquele que pode me ligar e falar: "Cara, tô precisando de tal parada"E minha resposta será: "Num me enche, sua puta... Quer que horas?"

Jedi

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Não sei se consegui expressar tudo que gostaria assim sendo, para finalizar, um texto, nada menos do que perfeito, sobre a amizade. Identificação total.

“Tenho amigos que não sabem o quanto são meus amigos. Não percebem o amor que lhes devoto e a absoluta necessidade que tenho deles.A amizade é um sentimento mais nobre do que o amor, eis que permite que o objeto dela se divida em outros afetos, enquanto o amor tem intrínseco o ciúme, que não admite a rivalidade.E eu poderia suportar, embora não sem dor, que tivessem morrido todos os meus amores, mas enlouqueceria se morressem todos os meus amigos! Até mesmo aqueles que não percebem o quanto são meus amigos e o quanto minha vida depende de suas existências…

A alguns deles não procuro, basta-me saber que eles existem. Esta mera condição me encoraja a seguir em frente pela vida.Mas, porque não os procuro com assiduidade, não posso lhes dizer o quanto gosto deles. Eles não iriam acreditar. Muitos deles estão lendo esta crônica e não sabem que estão incluídos na sagrada relação de meus amigos.Mas é delicioso que eu saiba e sinta que os adoro, embora não declare e não os procure.

E às vezes, quando os procuro, noto que eles não tem noção de como me são necessários, de como são indispensáveis ao meu equilíbrio vital, porque eles fazem parte do mundo que eu, tremulamente, construí e se tornaram alicerces do meu encanto pela vida.

Se um deles morrer, eu ficarei torto para um lado. Se todos eles morrerem, eu desabo!
Por isso é que, sem que eles saibam, eu rezo pela vida deles. E me envergonho, porque essa minha prece é, em síntese, dirigida ao meu bem estar. Ela é, talvez, fruto do meu egoísmo.
Por vezes, mergulho em pensamentos sobre alguns deles.

Quando viajo e fico diante de lugares maravilhosos, cai-me alguma lágrima por não estarem junto de mim, compartilhando daquele prazer...

Se alguma coisa me consome e me envelhece é que a roda furiosa da vida não me permite ter sempre ao meu lado, morando comigo, andando comigo, falando comigo, vivendo comigo, todos os meus amigos, e, principalmente os que só desconfiam ou talvez nunca vão saber que são meus amigos!

A gente não faz amigos, reconhece-os."

Vinícius de Moraes
 
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